Profissão jogador de futebol: o lado oposto da fama
Foto: Arquivo pessoal/Ricardinho
As dificuldades da carreira de um atleta profissional que defende clubes menores no futebol de campo no Brasil
Fama, luxo, casas, festas e altos salários. Essa imagem dos atletas de futebol gera ilusão sobre a profissão. Na prática, a grande maioria dos jogadores convivem com uma realidade bem diferente: atrasos de salários, limitações do regulamento dependendo da categoria que podem dificultar as negociações dos atletas com os clubes e risco constante de desemprego.
Ricardo André Félis Reis, ou simplesmente Ricardinho, é mais um dos milhares de jogadores de futebol no Brasil. Experiente o atleta já atuou em equipes conhecidas, como a Cabofriense-RJ, Inter de Limeira-SP, Linense-SP, e também fora do país.
Com ampla bagagem no esporte, em seus 11 anos de carreira, Ricardinho já enfrentou e enfrenta as dificuldades de ser um jogador de futebol profissional, e vive diariamente a luta para colocar comida na mesa de casa com a sua profissão.
Segundo informações publicadas pelo portal Guia da Carreira, no estado de São Paulo, onde Ricardinho vem atuando nos últimos anos, há uma variação com quatro categorias para os pisos salariais. Para a capital com até 30 funcionários, os salários são de aproximadamente de R$ 948,00; para clubes da capital e municípios circunvizinhos que tenham mais de 30 empregados, o valor-base é de R$ 1.010,00; enquanto para equipes do interior com até 60 empregados, o piso é de R$ 948,00; já para times com mais de 60 empregados no interior, R$ 1.010,00.
“O futebol ilude muito. Até o menino que inicia vislumbra coisas grandes de acordo com o que vê na televisão, mas não é a realidade para todos. Todos vivem nesse sonho, buscam ganhar coisas grandes, conquistar o melhor para família. Não é nem uma ilusão, é a realidade. Existe uma desigualdade muito grande, são jogadores que tem o seu valor, ganham muito, mas parte disso poderia ser investido a ajudar outras equipes que possuem pouco. Mas aí batemos em outra tecla, até onde a pessoa pode ajudar sem algo em troca. A desigualdade sempre aumenta, as pessoas tiram proveito para si e ela continua existindo”, lamentou o jogador, que apesar de se destacar com a camisa do Clube Atlético Linense na Série D, foi impedido de assinar por outros clubes de divisões superiores, visto que já tinha disputado a Copa do Brasil pela Inter de Limeira em 2018, e o regulamento não permite que um atleta dispute uma nova competição nacional por um terceiro clube no mesmo ano.
“O futebol ilude muito. Até o menino que inicia vislumbra coisas grandes de acordo com o que vê na televisão, mas não é a realidade para todos”
Ricardinho
Mesmo sem viver a fama propriamente dita, muitos jogadores acabam recebendo rótulos de “vida fácil”, muito por tudo o que as pessoas assistem na mídia, com jogadores como Neymar, Cristiano Ronaldo e Messi em seus carros importados, nas melhores festas e com salários astronômicos.
“Costumo dizer que só sabe a realidade do futebol quem vive dele. Quem tem que abdicar de festas, de estar com a família, esposa, filhos, aqueles que não possuem feriados, folga. Existe um preconceito com relação a parte de trabalho, muitos não entendem que é seu ganha pão, que somos registrados em carteira como profissionais, que temos que evitar muita coisa, como álcool, festas, curtições, temos que cuidar da alimentação, do corpo, fora que temos todas as dificuldades enfrentadas pelo futebol brasileiro. Gostaria muito que a concepção do futebol fosse mudada na cabeça de muitas pessoas, pessoas que podem ajudar e não tem essa intenção. As vezes até soltam comentários ruins”.
Atrasos de salários
Outro ponto frequente na carreira de um jogador de futebol profissional são os atrasos de salários. “É uma triste realidade, é algo constante. O que mais me magoa é que nada é feito. Eu passei por isso até fora do país. Nós atletas nunca temos força o suficiente para brigar com isso, a lei é tão falha que dá permissão para os clubes deverem por três meses, só depois nós podemos entrar com recurso”, disse Ricardinho, que completou.
“Temos que nos atentar com a inadimplência que existe com muitos atletas que se empregam no primeiro semestre, convive com a inadimplência de muitos clubes, não recebem e ainda amargam o desemprego no segundo semestre”.
Sem emprego ou com salários atrasados, muitos atletas profissionais acabam tendo que disputar partidas em campeonatos amadores para receber, como também já fez Ricardinho. “É uma triste realidade, pois sabemos que alguns empresários que amam o futebol, mas de uma maneira não é interligado ao futebol profissional, realizam campeonatos até por intermédio de influenciar o esporte na cidade, e com isso, alguns costumam reforçar os seus times com jogadores profissionais, atraindo com a parte financeiro de jogadores que acabam tendo isso como um refúgio, uma maneira de conseguir algo em dinheiro. Eu confesso que já joguei no amador por dinheiro”.
Se já não bastasse todos os problemas de estrutura e falta de organizações nas competições, o futebol atual envolve diretamente outra profissão: os empresários.
Essa profissão está diretamente ligada a modalidade nos dias atuais, mas temos que dividir em duas categorias, sendo os verdadeiros empresários, que ajudam o atleta e buscam o seu melhor; e os falsos, que buscam apenas ganhar dinheiro com os jogadores e não pensam no bem do mesmo.
“O empresário tem parte benéfica e maléfica. Grandes empresários tem a intenção de ajudar mesmo os atletas e tudo mais, mas tem outros que criam uma máfia, onde só jogam quem são deles, só possuem interesse em benefício próprio. É algo constante também”, finalizou o jogador.
Com 28 nos, Ricardinho atualmente cumpre “férias forçadas”, e retorna a sua carreira na próxima temporada, onde defenderá a Portuguesa-RJ, pelo Campeonato Carioca.
Esse é o caminho de diversos atletas, que sem emprego no segundo semestre, aguardam ansiosamente a temporada seguinte, para conseguir voltar a trabalhar aproveitando dos campeonatos estaduais.